O inimigo da massa


Muito mais do que o inimigo externo, também a massa odeia e teme o seu inimigo interno. “Cada um dos membros de uma tal massa abriga em si um pequeno traidor, que deseja comer, beber, amar e ter o seu sossego”*, aliás, como normalmente todo o mundo.

Esses desejos de vida, tão simples e despretensiosos, são, porém, individuais. São a expressão mais imediata da “força natural”** de cada um para afirmar, a seu próprio modo, a sua existência singular.

É, necessariamente, na livre expressão dessas forças individuais que os membros da massa tendem a se apartar uns dos outros. Esses desejos, tão naturais e leves, tendem resgatar o indivíduo de sua igualação com os demais.




* CANETTI, Elias. Massa e poder. 4ª reimpressão. Trad. Sérgio Tellaroli. São Paulo: Companhia das Letras, 2013 [1960]. P. 21.

** SPINOZA, Benedictus de. Oeuvres V: Traité politique. Trad. Charles Ramond. Paris: PUF, 2005 [1677]. II, §5. P. 97.

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